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Lia Bock

Desejar que o ex se ferre é pecado?

Universa

27/08/2019 04h00

(iStock)

Quem nunca desejou, mesmo que silenciosamente, que tudo desse errado na vida do ex? Geralmente isso acontece quando a relação termina unilateralmente pela vontade do outro ou porque a sacanagem foi tanta, que é impossível colocar em prática os conceitos budistas de entregar e deixar ir.

Nessa hora sempre lembro da Beth Carvalho e de sua música que não por acaso se chama "vou festejar" e canta em alto e bom samba: "vou festejar, o teu sofrer, o teu penar". 

Muitas vezes o sentimento não está atrelado a nenhuma ação que cause grande dano ao outro. Mas será que espumar ódio e desejar, com o fundo da alma, que tudo dê errado pro antigo amor não tem um pezinho no lado maligno da força?

Se pensarmos que sentimentos também são uma forma de energia no mundo, estamos diante de algo bem sombrio. Querer que o outro morra (ok, esse é extremo, mas acontece!), que nunca mais se apaixone, que seja demitido, perca todos os amigos e se possível todos os dentes é um troço polêmico. Porque convenhamos, é praticamente impossível desejar tudo de ruim e não colocar nenhuma coisinha em prática. E dificultar a vida do outro, sua relação com os filhos, atrapalhar a mudança, arrumar problema com a divisão dos bens, dos amigos ou dos pets são atitudes que muito provavelmente estão enraizadas nesta raiva que babamos sem controle. 

Já vi gente dizendo "sou incapaz de fazer mal" e ao mesmo tempo fazendo de tudo pra dificultar a vida do ex. Verdade que "dificultar a vida" não é a mesma coisa que colocar em prática os planos indizíveis que passam pela nossa cabeça, mas se esconder atrás dessa falsa moral dos bonzinhos de meia-tigela também não é nada bacana. 

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Talvez o mais sincero seja assumir que desejamos o mal e vestir essa carapuça. Aceitar que um ódio destilado circula em nossas veias e avisar o outro que "daqui não vai sair nada de bom ou amistoso", pelo menos, não até segunda ordem. 

Porque este é outro ponto, querer que o outro se ferre tem prazo de validade, né? Esse negócio de ficar ruminando a raiva por anos a fio ficou pra trás, deixamos lá nos tempos dos casamentos ditos insolúveis e que ninguém trabalhava com a possibilidade de um dia ser traído. 

Hoje, casamos sabendo que a) pode acabar e b) fidelidade só existe com companhia aérea. 

Claro que tudo isso é muito fácil de dizer quando não estamos no papel do corno, do bobo ou do sofredor, mas a verdade é que o ódio não nos leva a nenhum lugar bacaninha e, podem reparar, os que desejam o aniquilamento alheio estão produzindo um atoleiro onde os maiores prejudicados são apenas eles mesmos. Desejar silenciosamente o mal do ex produz sentimentos, gases, pensamentos e muito provavelmente dores e rugas que só servem para intoxicar quem está sentindo. 

Eu sei que não é fácil, e às vezes precisamos de um tempo para sair da lama de um término mal resolvido, mas é importante ter em mente que a única vingança bacana é ser feliz, muito feliz, mais feliz do que em qualquer outra fase da vida. E, lembremos, carregando ódio e pensamentos destrutivos nunca chegaremos nesse lugar magnânimo.

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

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