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Lia Bock

Caro Bolsonaro: infelizmente nossos filhos mentem, roubam e dirigem bêbados

Lia Bock

17/05/2019 04h42

(iStock)

Tem uma frase que eu gosto muito que diz "criar filho é fácil, educar é que é difícil". Nada mais verdadeiro no mundo de pais, mães e cuidadores do que isso. Passar valores éticos, dar limite, saber a hora de estimular e a hora de segurar é um baita desafio.

E o que mais vemos são pais fazendo vista grossa para as questões dos filhos: está com problemas na escola? É incompetência da instituição. Está com questões de relacionamento? O mundo não compreende meu filhinho querido. Teve quiprocó no futebol? Muda de escolinha porque essa não presta. E por aí vai.

Claro que é importante discutir as questões coletivamente, envolver a comunidade no problema e não individualizar tudo – em alguns acontecimentos no mundo a culpa é de todos nós.

Mas fechando o foco na relação entre pais e filho: tem muita gente por aí sem disposição nenhuma para ver as limitações da própria prole. Encarar de frente que ele (ou ela) está com problemas, assumir que ele (ou ela) não foi bacana ou que foi desonesto ou desonesta é encarar os fatos de frente, e sim: é para os fortes.

Quando um problema é descortinado, o mais comum é vermos atiçado nosso mais cru instinto maternal (ou paternal) puxando a cria pra debaixo de nossas asas e jogando a culpa em qualquer um que seja, menos no nosso filhinho querido.

A gente viu um exemplo didático sobre isso recentemente em um jogo de futebol de crianças em Brasília. Convencido de que o filho de oito anos foi agredido no parquinho, o pai segura o outro garoto e ordena que o filho bata nele. Pra completar a cena dantesca a mãe chega e também bate no menino – que como testemunhamos pelas câmeras de segurança era totalmente inocente. Esse é um ótimo exemplo do delírio e da falta de senso de educação dos pais que não souberam avaliar com frieza e distância a situação e muito menos lidar com o problema.

Dou esse exemplo porque a gente não pode sempre acreditar nos nossos filhos. Infelizmente eles podem mentir ou apenas ter uma visão deturpada da realidade. Quanto mais novos, maior a probabilidade dessa segunda hipótese, quanto mais velhos, maior a chance de estarem mentindo mesmo. Pois é: filhos mentem.

E aqui me vem em mente nosso excelentíssimo presidente e seu filho Flávio.

O Ministério Público do Rio de Janeiro vê "indícios robustos dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no gabinete de Flávio no período em que ele exercia o mandato de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, de 2007 a 2018", mas Jair, o pai, vê apenas a injustiça do mundo contra seu filho (igualzinho ao pai de Brasília?) Flávio nega. O Ministério Público investiga e soma provas. E Jair? Jair diz que o filho está sendo esculachado e fala de complô.

Ao pai Jair minha solidariedade. Não é fácil lidar com a independência e as decisões (muitas vezes erradas) de nossos filhos. Porque sim: nossos filhos fazem bulling. Nossos filhos dirigem alcoolizados. Nossos filhos queimam índio. Nossos filhos roubam.

E na hora em que alguma podridão, defeito ou falha de caráter de nossas crias vêm à tona bate uma tristeza danada e uma culpa gigantesca. Porque quando encaramos o fato de que nossos filhos falham, algo em nós falha também. Quando nossos filhos mentem, sentimos que tudo foi em vão.

Mas é preciso encarar a realidade. É preciso olhar de forma crítica para a prole. É preciso saber o momento de tirar os herdeiros de baixo de nossa asa e dizer: agora você vai responder pelo que fez. Mudar de escola, de bairro ou simplesmente negar não nos levará a um lugar melhor. Ao contrário. Só mostrará que de fato erramos (e seguimos errando) na educação que escolhemos dar.

É fundamental que saibamos ver os defeitos e os erros de nossas crias. De outra forma, seremos um monte de pais e mães defendendo seus pobres filhos injustiçados e segurando o coleguinha pro filho bater.

 

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

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