Monogamia: meta, problema ou não falamos nisso?
Eu estava aqui desfrutando da minha vida de casada e acreditando no amor (sou dessas) quando comecei a ler o livro Casos e casos, repensando a infidelidade da terapeuta americana (e sucesso de vendas e palestras) Esther Perel.
Que banho de água fria.
A meta do livro é entender, definir e cavocar a infidelidade, e pra isso ela solta logo de início uma bomba: nós, modernos seres deste século tão cheio de liberdades e vontades, estamos criando uma utopia. E ela se chama 'casamento por amor'.
O que Esther traz sem papas na língua é que do jeito que estamos construindo nossos relacionamentos românticos estamos nos jogando num caldeirão de traição. Gente! Quero fazer diferente. Tem como? Deixa eu dividir com vocês o raciocínio dela:
"Nunca nossas expectativas acerca do casamento haviam tomado proporções tão épicas. Ainda queremos tudo que a família tradicional deveria suprir – segurança, filhos, bens imóveis e respeitabilidade –, só que agora também queremos que nosso parceiro nos ame, nos deseje e seja interessado em nós. Devemos ser melhores amigos, confidentes e amantes fervorosos".
Vocês não querem isso? Eu quero. Mas aí ela dá o tapa de realidade:
"A imaginação humana criou um novo Olimpo: que o amor permaneça incondicional, a intimidade fascinante e o sexo fantástico, a longo prazo, com a mesma pessoa. E o longo prazo não para de aumentar."
Na minha cabeça comecei a conversar com a autora. "Puts, Esther, não dá pra negociar. Isso é mesmo tão impossível?" Na verdade o que ela está fazendo com este balde de gelo é mostrar que traição não é, ou deveria ser, tão fim do mundo assim. E se a gente descer um pouco desse "Olimpo" que criamos, começaremos a ver com outros olhos o que muitas vezes nos revira em demônios. O que ela está dizendo é que antigamente, no tempo das nossas avós, as pessoas esperavam bem menos dos casamentos e às vezes, pasmem, eram mais felizes com isso.
Não sei pra vocês, mas pra mim foi um choque. Como pode um casamento arranjado, ou em que os noivos nunca haviam se tocado nus, ser mais feliz que um casamento por amor e paixão?
Tem outro parágrafo em que ela explica (praticamente desenha) porque esse nosso mundinho do casamento maravilhoso nos leva ao fracasso. Sim, tô dramática hoje.
"O pequeno círculo da aliança do casamento contém ideias extremamente contraditórias. Queremos que nosso escolhido ofereça estabilidade, segurança, previsibilidade e confiabilidade – todas as expectativas que nos servem de âncora. E queremos que a mesmíssima pessoa nos ofereça estupefação, mistério, aventura e risco. Me dê conforto e me dê exagero. Me dê familiaridade e me dê novidade. Me dê continuidade e me dê surpresa. Os amantes de hoje procuram ter sob o mesmo teto desejos que desde sempre tiveram lugares separados."
Agora, misture todas essas vontades (que sim, temos) com diversos tipos de redes sociais e um senso de liberdade individual nunca experimentado antes. Só pode dar merda.
E reparem o jeito como ela reforça "mesmíssima pessoa" como se apontasse o absurdo da situação. Corei.
Aqui, vale lembrar que há bem pouco tempo o esposo e a esposa eram uma coisa: pais, mães, parceiros na criação dos filhos e resignados cada um no seu papel dentro da casa. O fogo, para os caras, morava noutro canto e, pras mulheres… bem, pras mulheres morava na cabeça delas ou muito bem escondido e raro noutro canto também. E assim viviam "felizes para sempre".
Claro que ela não está dizendo que isso é bom e em alguma outra parte do livro que perdi a autora deixa isso claro. Mas que ela tá dizendo: ACORDA pras nossas expectativas românticas de monogamia de mãos dadas com a felicidade, o amor, o tesão e a parceria, isso tá.
Beijo. Vou meditar.
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