Morte do nu deixará 7 bilhões de corpos com os quais teremos que lidar
É com muita tristeza que venho comunicar a morte desse ente tão amado. O nu sempre foi um companheiro generoso. Desde a mais tenra infância ele me acompanha e zela pela minha sanidade.
No corpo dos meus pais e dos meus irmãos, o nu sempre esteve presente no único banheiro de nossa casa. Me acompanhou singelo também nas aventuras adolescentes. O nu esteve comigo numa noite quente em Ubatuba quando nossa turminha de garotas, num ato rebelde, resolveu deixar as roupas na areia e mergulhar na escuridão.
O nu estava também na primeira vez em que fui ao teatro com o colégio. Juro. Eu tinha 10 anos e a escola o nome de Nossa Senhora. Na peça, a atriz principal tomava banho numa cachoeira. A água era falsa, de papel crepom, mas o nu era real. Fascinante. Depois da apresentação, a atriz se sentou no centro do palco e respondeu à perguntas dos alunos. A maioria delas sobre o corpo desnudo, claro. O nu, quando queria, era o centro das atenções.
Deixará saudades o nu.
Nossos tempos em Londres foram gloriosos. Ali ele era rei. Foi rei também no palco de Zé Celso e no corpo de Caetano Veloso. Como esquecer. Foi travesso com Tom Zé, quando zombou da ditadura pondo cu onde se via boca. Era 1973 e nu estava bombando.
Nu esteve comigo também num momento de protesto. Impávido, firme, apenas parado para marcar, com o corpo, uma injustiça latente. O ano 2000 tinha acabado de começar.
Esse nu que me emocionou em tantos livros, filmes e na capa de algumas revistas… Esse nu que ensinou meus filhos a respeitarem as diferenças e a tratarem com naturalidade o que é natural… Esse nu, tão amado, parte hoje.
Morre de desgosto e solidão, acusado de crimes que jamais cometeu.
Mas nu deixa filhos e netos corajosos e cientes de que é preciso seguir com este legado. Nu deixa seguidores, amigos e muitos fãs. Gente que desfrutou de sua presença poderosa e sabe que nu é inocente.
Nu deixa 7 bilhões de corpos com os quais teremos que lidar.
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