Se WhatsApp passar a cobrar por mensagem, será que nossa vida melhora?
Lia Bock
22/10/2019 04h00
(iStock)
Quando o WhatsApp chegou ao Brasil, lá nos idos de 2009, parecia uma bênção alcançada. Lembremos que até então a gente pagava por cada mensagem enviada – ou tinha um plano ilimitado caríssimo. Rapidamente o app das mensagens instantâneas viralizou e as benesses de não pagar para dar aquele salve foram efusivamente celebradas. Eu vibrei. Doce ilusão.
De lá pra cá muita coisa mudou e chego a ter nostalgia daquele sentimento ingênuo. Ficamos ultrassensíveis para chefes, clientes e pessoas com pouca sensibilidade noturna, depois começamos a ter que lidar com o excesso de grupos e eis que dez anos depois eu só penso que se ainda hoje as mensagens fossem pagas, talvez a gente não estivesse se afogando em zap.
Imagina aquele sujeito que inunda o grupo com os links das quatros newsletter que lê todo dia de manhã? Se tivesse que pagar, talvez ele pensasse duas vezes se mandaria por email – Amém. Imagina aqueles que escrevem uma palavra e dão enter, mas duas palavras e enter, mais uma palavra e enter? Com certeza iriam se condicionar a dar um enter só no texto completo e nos evitariam aquele senso de urgência e de desgraça que vêm quando o celular apita muitas vezes seguidas.
Os grupos de pais da escola também seriam muito mais civilizados, ninguém ia ficar se repetindo ou se sentindo na obrigação de debater todas as polêmicas se a cada clique tivessem alguns reais envolvidos.
E antes que vocês perguntem se eu estou maluca, me explico: não é que eu queira pagar pra enviar mensagem, mas tendo em vista a surra de zap dia sim dia também, meu desespero aumenta e penso como chegamos até aqui. Fomos brindados com uma ferramenta gratuita para envio de mensagens e em dez anos viramos uma central de inutilidades ambulante. Muitas vezes penso que não temos maturidade para usar o WhatsApp e nem colhão para criar regras claras para uma comunicação comedida e útil via celular.
Sim, porque já vi muita gente se queixando desse ou daquele grupo ou de pessoas específicas, mas poucos tem coragem de falar isso na cara – ou melhor, no Whats. Entram no outro grupo pra queixar de alguma coisa, mas mandar a real ali mesmo e tentar civilizar as conversas, ninguém tem coragem. Porque será, não é mesmo?
Não é porque essa ferramenta é de uso livre e pede o bom senso de cada um que as pessoas precisam ficar engolindo sapo. WhatsApp é conversa, é comunicação e como todo tudo que está nessa seara precisa de regras éticas.
Fulaninho não para de mandar fake news? Devolve textão pedindo checagem. Pais da escola estão falando mal dos professores no grupo? Avisa lá que o endereço da escola é outro! Tem criança entrando no celular dos pais e exagerando nas postagens? Dá um alo preventivo para estes genitores. Carinha tá surtado no envio de sacanagem? Avisa que não há interesse neste tipo de mensagem.
A importante é a gente ir discutindo a quantidade e a qualidade dessa trocas porque se a regulação somos nós, precisamos fazer nosso trabalho.
E claro que não estou falando de um dia o outro quando algo extraordinário ou catastrófico acontece e o Whats entra em surto. Isso faz parte. Tô falando do dia a dia mesmo em que somos atropelados por toda sorte de mensagens e não conseguimos concluir um pensamento sem que apareçam duas ou três mensagens novas.
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Às vezes eu acho que o problema não está no Whats em si, mas na falta de outras formas de relacionamento. Estamos tão acostumados a nos comunicar por essa mídia que esquecemos que ela tem uma função e que para algumas mensagens, existem outros meios.
Eu por exemplo acho que para textos longos, brigas, cartas ou coisas com datas e tópicos que precisam ser lembrados, nada melhor do que o email. Mais fácil de localizar e as pessoas não precisam receber no meio de uma reunião, da festa da escola ou em ouros momentos nos quais não precisariam ser importunados por motivos torpes.
"Ah, mas o e-mail vai morrer", me dizem os fatalistas. Tomara que não, porque se as planilhas, as newsletters e a comunicação oficial da escola começarem a entrar pelo zap daí sim a gente não vai fazer mais nada da vida.
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Sobre a autora
Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock
Sobre o blog
Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.