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Claro que dá pra perdoar uma traição. Mas trair não é normal, taokei?

Lia Bock

15/10/2019 04h00

(iStock)

Tem muita coisa no mundo favorecendo a traição dentro dos casais. A começar pela tecnologia, com as redes sociais que mais parecem uma vitrine de gente, e os apps de troca de mensagem, que deixam qualquer um a um clique de nós. E não para por aí, tem até site especializado em conectar pessoas casadas.

Site este, aliás, que se chama Second Love e me mandou uma pesquisa onde, pasmem: 66% dos entrevistados acreditam que ter um companheiro ou companheira limita a possibilidade de realizar fantasias sexuais. E pior: 78% admitiram que jamais conseguiram realizar suas fantasias sexuais com o companheiro ou companheira. Gente, que triste! O casamento está muito desmoralizado mesmo. E, curiosamente, bem nesses tempos em que se fala muito na família tradicional e na importância do matrimônio.

Vocês também enxergam uma hipocrisia podre nisso tudo?

Não discutimos novos formatos de relacionamento, achamos que relacionamento aberto é coisa de artista desmiolado, pregamos a fidelidade na saúde ou na doença, mas mantemos amantes, crushes e contatinhos extraconjugais no zap como se isso fizesse parte do acordo monogâmico.

Claro que podemos perdoar uma traição, mas o que não podemos é passar a mão na cabeça de quem que faz o acordo da monogamia por livre e espontânea vontade e depois não cumpre.

Alguma coisa não fecha nessa matemática e, sinceramente, eu não acho que seja o fato de as pessoas terem amantes. O problema não está em não conseguir ser monogâmico e, sim, em pregar a monogamia sendo que não temos a menor condição de cumprir com esse acordo! Deu pra acompanhar?

Ninguém sai por aí fazendo acordos que não consegue cumprir (sai??), mas no casamento vivemos fazendo isso. E eu pergunto, em nome do quê? Parecer correto é mais importante do que ser correto? Essa lógica realmente me intriga. 

E se todo mundo que se serve de amantes na vida fosse verdadeiro com o companheiro ou a companheira e dissesse: "Olha, esse negócio de não transar com mais ninguém não é pra mim. Vamos fazer um combinado diferente?". O que será que aconteceria?

Por que não cumprir com o acordo de monogamia é ok, mas assumir que não consegue cumprir esse acordo não é bacana? 

Entendo que, em outros tempos, quando os casamentos não acabavam, ter amantes fazia parte da cultura. Mas hoje temos mais gente se separando do que casando e ninguém mais precisa manter uma relação infeliz. Então qual a lógica de trazer a cultura do amante pra dentro dessas vidas modernas?

Quando o divórcio virou uma possibilidade, deveria ter deixado pra trás esse "jeitinho" que as pessoas davam pra diversificar amorosa e sexualmente. Mas não e, assim, aqui estamos, mergulhados na hipocrisia marital sem necessidade alguma. Selando acordos que sabemos que não cabem na nossa vida, fazendo promessas de que não vai se repetir e enganando a nós mesmos em nome de alguma coisa que ninguém sabe muito bem o que é. 

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Vocês já se perguntaram porque é tão necessário ser monogâmico? Não seria muito mais honesto ser o que somos e ir até onde conseguimos?

Essa lógica do casamento perante Deus e com regras celestiais está gerando um bando de casais desestimulados sexualmente e, pra ficar na linguagem divina, um bando de casais pecadores. Deus me livre!

Triste vida a dessa gente. 

E, vejam, não estou dizendo que não dá pra ser fiel ou que não dá pra realizar as fantasias na mesma cama onde maratonamos o seriado novo. Ao contrário: acho que dá e tem muita gente fazendo isso. Na maioria das vezes, são as pessoas que estão encarando de frente as limitações das relações e as vontades de cada indivíduo e colocando em prática o respeito que prometemos ao padre, mas esquecemos para fora de casa assim que deixamos a igreja. 

Tá mais do que na hora de a gente falar em outros formatos e assumir que não cumprir um acordo firmado é péssimo, é feio e não deveria ser visto como algo que "ah…todo mundo faz". 

Para seguir:
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Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

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