A violência obstétrica está entre nós. Queira o Ministério da Saúde ou não
Universa
07/05/2019 04h32
(Foto: iStock)
Não faz muito tempo que o termo "violência obstétrica" foi cunhado. O objetivo sempre foi claro e muito nobre: sublinhar os abusos físicos e psicológicos no pré-natal e no parto. Ambos momentos de fragilidade, em que nem as mais aguerridas e fortes conseguem se defender com a atitude necessária.
A ideia é dar nome aos bois e punir os profissionais de saúde que optam por uma postura antiética e, claro, evitar que tais posturas apareçam.
E esse tipo de violência é real. Cesáreas sem indicação clínica por mera conveniência médica ou hospitalar é uma delas. Mas chega a maus tratos – muitas vezes filmados pelos parentes da vítima.
Pois a gente tinha um problema real, a violência obstétrica, pra resolver mas em vez de se dedicar a evitar e sanar a questão o Ministério da Saúde fez o quê? Resolveu abolir o termo.
Claro, porque se a gente não chama mais o mal pelo nome feio que ele de fato tem, ele não parece tão mau, não é mesmo?
É mais ou menos como estar perdendo o jogo e resolver acabar com ele levando a bola embora. Ou então, estar com o nome sujo e em vez de pagar as dívidas tentar mudar o nome pra se livrar delas. Um misto de infantilidade e má fé.
Violência obstétrica é um nome forte, porque o ato é forte. Ser desrespeitada, mal-tratada ou subjugada na hora do parto é muito violento, pode custar uma, duas ou mais vidas. Pode custar a sanidade mental. Pode custar um trauma pra sempre. Dentre outras coisas.
Precisamos chamar as coisas pelo nome que elas têm e lutar para que posturas abusivas sejam coibidas. E não passar pano para que o cenário nefasto seja pintado em algo menos grave do que realmente é.
Alguns podem dizer: "mas entre um médico que bate em uma paciente e um que não deixa o companheiro acompanhar o parto ou induz uma cesárea porque quer ir logo pra casa há uma grande diferença". Sim, então que hajam penas diferentes também. Mas não esqueçamos que o poder da equipe de parto é gigantesco e se o bom senso não serve para impor ética, que a possibilidade de punição o faça!
A violência obstétrica está entre nós e abolir o termo só nos dará a falsa sensação de resolução. Deixemos de usar a expressão quando pararmos de sofrer abuso na hora do parto, quando o tratamento humanizado for regra e nenhum médico acelerar ou negligenciar uma grávida para "acabar logo com isso" e quando respeito e cuidado forem a regra e os maus tratos a exceção.
Sobre a autora
Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock
Sobre o blog
Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.