WhatsApp, Telegram, Insta: tecnologia a serviço do fim dos casamentos
Lia Bock
27/03/2019 04h44
(iStock)
Na década de 90 o BIP se popularizou. Receber uma mensagem por escrito no aparelhinho que ia na cintura era o must em tecnologia da comunicação. Mas o bip não tinha senha e não foram poucos os casos de gente que pregava a monogamia e os bons costumes sendo flagrada ao receber mensagem de amor e encontros não protocolares –sacanagem não rolava, porque as telefonistas pra quem a gente ditava a mensagem não aceitavam. Mas teve muita gente criando códigos para burlar o elemento humano.
Logo o e-mail ganhou nossos computadores e nossa vida. A checagem era feita um ou duas vezes por semana e tendo em vista a falta de instantaneidade, a princípio, ele não acabou com muitos relacionamentos. Foi quando a checagem se tornou diária, lá pelo ano 2000 que o correio eletrônico começou a figurar na lista de ferramentas que destroem relacionamentos. O problema era simples: cada um tinha seu email, mas o computador ainda era um só pra casa toda. Péssima ideia se comunicar com amantes por ali. Mas uma péssima ideia que muita gente teve. Na década seguinte, não foram poucos os casos do "deixou o email aberto". Nem os mais cuidadosos se safavam. Ainda não havia um traquejo com a tecnologia e a cabacisse acabou sendo maior do que a destreza em equilibrar pratos.
A instantaneidade ganhou nossas vidas com o ICQ e, ali, meus queridos, foi a festa da uva. Não foi só casamento que acabou, teve gente que se perdeu completamente no mundo dos chats. Conheço algumas pessoas que (com certeza) trocaram o trabalho por paquera e o almoço pelo conversê sem fim. Era muita novidade. Era muita modernidade. Quando o MSN foi lançado foi preciso respirar fundo para entender que esse tipo de ferramenta estava chegando pra ficar e que precisávamos de maturidade para lidar com ela. E como na maioria das casas o computador ainda era familiar, era do trabalho que a galera arrepiava. Isso deu uma margem de segurança, já que dificilmente o cônjuge entraria na máquina do escritório.
O tempo passou e a turma dos bons costumes (pero no mucho) se profissionalizou. Quando o Twitter desembarcou em nossas máquinas já tínhamos algum traquejo no uso da tecnologia para fins secretos. As DMs nasceram para os amantes, casados ou não. E por ali muita gente se complicou e transformou o casamento em estatísticas. Outros, seguem surfando a marola dos casos extraconjugais por essa via até hoje.
Neste ponto as gadgets se firmaram como individuais, protegendo aqueles que pregavam a monogamia a altos brados, mas não cansavam de prospectar a nova presa. Foi um momento fugaz de paz aos desonestos. Teve gente que achou que nunca mais seria pego. Santa ignorância. Nada é mais obstinado do que um animal humano traído.
O Facebook chegou mais ingênuo, aberto, com seus bebês fofos e gatinhos sapecas. Ninguém usava o Face pra paquerar. A tal cutucada, que foi criada com este fim, acabou sendo vista como a institucionalização do flerte. A cara do Zuck, né? Um misto de travação com malícia juvenil. O Face sempre serviu muito mais para pesquisar, prospectar e vasculhar potenciais amantes do que para colocar a paquera em prática. E foi assim até ganhar seu próprio Messenger, claro. Não é que com ele as pessoas traíssem mais, mas elas passaram a se comunicar com os amantes como se não houvesse amanhã. Tenho certeza que se checarmos a data de lançamento, veremos na sequência um aumento de divórcios.
Vocês podem dizer, mas e o Insta? Bom, o Instagram sempre foi a rede social das pessoas solteiras. Definido por muitos como melhor que o Happen, a rede de fotos e selfies é pra ver e ser visto. Sempre serviu mais aos disponíveis do que aos que estão agindo sorrateiramente. Claro que quando ganhou as mensagens diretas deu uma guinada e passou a destruir alguns lares, mas nada que se compare ao WhatsApp.
O Zap veio que nem tsunami, acabou com casamento, amizade, almoço de domingo, eleições e algumas coisas mais. Verdade que a ferramenta revolucionou a comunicação, mas no que tange os relacionamentos amorosos o Whats fez um estrago danado. Principalmente quando a ferramenta Whats Web foi lançada. Ô ferramentinha invocada e dedo-duro. Ultra funcional para trabalho, ter o Whats na tela do computador (individual) facilitou a vida, mas ao mesmo tempo, fez pular na tela mensagens secretas e impublicáveis.
O casal estava lá pesquisando hotel para as férias em família e de repente salta diante dos dois uma mensagem de cunho sexual que pretendia entrar discretamente no aparelhinho de bolso. Ops! Fulaninho pede pra esposa abrir o computador e reenviar um arquivo que esqueceu de anexar. Durante a missão, pah! Pula na cara dela o comentário malicioso sobre o final de semana inesquecível. O Whats Web acabou com casamentos e também com dignidades, já que não foram poucos os traídos que assumiram o controle da ferramenta e estabeleceram uma comunicação com o amante do outro. Ui.
E o Telegram? Ah… o Telegram é aquele ícone de aviãozinho que aparece do nada no aparelho do outro sem comentário ou anúncio. Veio para abrigar as mensagens secretas que os espertos sabem que não rola trocar por WhatsApp. Porque o problema não são as ferramentas, são os seres humanos por trás delas.
Sei que o panorama é meio triste, mas a verdade é que enquanto tivermos tecnologia à mão e falso moralismo na cabeça seguiremos vítimas de nós mesmos.
Sobre a autora
Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock
Sobre o blog
Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.