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Lia Bock

No BBB, Petrix ataca novamente. Como saber se é assédio ou brincadeira?

Universa

30/01/2020 04h00

Nos últimos dias, a internet ficou em polvorosa por causa da mão inadequada de Petrix Barbosa que pegou e chacoalhou o peito da Bianca Andrade. Foi ou não foi abuso? Será que foi sem querer? Nessa madrugada, foi a vez de Flay: o colega "montou" na cabeça dela, e disse que foi brincadeira, claro. Assim, roçou a genitália no pescoço dela e incomodou. Não sou fã de BBB, mas acho a discussão muito interessante.

Antes de entrar na questão do ato em si, vale lembrar que em apenas uma semana de confinamento a macharada da casa já mostrou a que veio: passar vergonha. Como questionou Felipe Neto, "onde será que o BBB foi pra achar esse grupo de macho lixo?". O Stalkeadas também enumerou os comentários abobalhados e machistas das participantes.

Já está bem claro que aquela turma vê mulher como objeto. Pois é nesse contexto que temos Petrix, sua mão e uma Bianca totalmente alcoolizada. E isso é importante pra gente emitir uma opinião ou analisar o ocorrido. Contexto é tudo nessa vida.

Desde que começamos a compartilhar casos na #meuprimeiroassedio e a falar abertamente sobre cultura do estupro e comportamentos abusivos que antes eram tolerados, colocamos na mesa não só as mãos bobas, mas a sensação de não saber se determinado ato foi sem querer, sem maldade ou se foi de fato um abuso.

E essa sensação é terrível. É ela que faz a própria vítima se sentir culpada e perpetua uma cultura de pequenos abusos cotidianos. Precisamos falar sobre o assunto porque essa dúvida é real. E, muitas vezes, a resposta demora a vir.

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Abraços exagerados, esfregadinhas e toques inconvenientes são comuns na vida das mulheres. E, numa olhada menos atenta, pode parecer algo que acontece sem querer. Aqui vou usar a explicação que dou para meus filhos: quando a gente toma uma atitude, precisa assumir o risco envolvido nela. "Eu não derrubei o quadro por querer", eles dizem. Mas quando jogou bola na sala assumiu o (enorme) risco de causar um dano mais sério, certo?

Não é uma questão de culpa, mas de responsabilização.

O mesmo vale para esses toques limítrofes. Quando um cara encosta em uma mulher sem necessidade, ele assume o risco de ela ficar incomodada. Se esse toque acontece em lugares mais, digamos, privados do nosso corpo, um tanto pior. Um aperto na mão pode ser desagradável, uma pegada no braço também, mas um apertão nas costelas, rente ao seio, é como jogar futebol na sala com uma bola de pilates, concordam? Se foi "sem querer", foi sem querer querendo.

Mas o mais intrigante é que muitos caras assumem esse risco com frequência. Abraçam encostando mais do que pede a intimidade existente, pegam pelo braço como quem precisa evitar que a mulher fuja ou encostam o pinto como quem, ops, só deu uma esbarradinha. A gente sabe porque convive com isso! Com essa invasão disfarçada que, no fundo, quer mesmo é tirar uma casquinha e um sarro.

O que Petrix nos proporcionou foi a oportunidade de falar sobre essa cultura que desrespeita o corpo da mulher. Dessas pegadas, encostadas, cutucadas, raspadas e balançadas que nos colocam na posição de objeto e são altamente nocivas para nossa autoestima e para a nossa sanidade mental.

E há quem diga, "mas é muito diferente uma pegada desse tipo e um estupro". Óbvio que é. Mas já está mais do que na hora da gente entender que não precisa ser estupro (ou porrada) para ser abusivo.

Façamos um exercício de empatia invertendo os papéis: você, homem, pense num sujeito o abraçando de modo tão intenso que encosta o pinto na sua perna; ou o abraçando por trás, quase com fofura, de modo que o pinto dele se encaixa na sua bunda; ou então pegando na sua coxa de uma maneira que a mão dele esbarra nas suas bolas. É bizarro, não é? Pois bem. Essa pegadinha nas costelas que esbarra nos seios é isso — sem por nem tirar.

E, se foi "sem querer", apenas pare. A costela é nossa e, salvo autorização e intimidade expressas, não precisa receber nenhum tipo de carinho, apertão ou balançadinha marota.

 

 

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

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