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Lia Bock

Com que roupa você salvaria o mundo?

Lia Bock

08/03/2019 10h45

(iStock)

Das vestes acima, qual você acha que destoa do compromisso "salvar o universo"? Me digam, quem, em sã consciência, sai pra salvar o mundo de shortinho, tomara-que-caia, tiara e bota de salto? Enquanto look de super-herói, a roupa da Maravilha é ótima pro Carnaval. O que sobra de charme e sex appeal falta em funcionalidade.

Poderosa, forte, guerreira, Diana, a rainha das amazonas, é o equivalente ao Super-Homem. A mulher que com seus poderes, sua sabedoria, sua força e seu laço da verdade luta (literalmente) contra os males e as guerras. Mas por que deram a ela este outfit tão equivocado?

Muito mais adequado seria um macacão como o da Mulher Elástica (do Super-Homem, do Capitão América, da Capitã Marvel e de tantos outros salvadores do universo mágico).

Mas à Diana não basta ser linda, é preciso parecer linda. Mais ou menos o que acontece toda mulher que se preste, não é mesmo? (contém ironia).

Podemos chamar este fato de paradoxo da Maravilha: ela foi concebida e criada para salvar o mundo, mas sua roupa foi feita para as passarelas. E é nesta contradição que vivemos muitas de nós. Queremos ser reconhecidas por nosso trabalho, mas passamos duas horas escolhendo a roupa da entrevista de emprego. Não queremos ser mais sexualizadas, mas ansiamos por poder postar nosso dorso nu nas redes sociais.

Hoje, neste 8 de março parido num pós-Carnaval babilônico e político, o paradoxo da Maravilha mostra como é difícil ser mulher em 2019. Não porque seja penoso lidar com nossos desejos polivalentes, mas porque é complexo demais explicar nossa existência multifacetada. Principalmente quando nos unimos em torno deste conceito único de mulher. Não é por acaso que vemos a Globeleza vestida ao mesmo tempo que os mamilos tomam as ruas no Carnaval. Ambas são vitórias importantes e, não se enganem, convergem logo ali na frente.

Porque sim, somos todas mulheres, mas nossas histórias nos trazem experiências e necessidades diferentes. E não é porque lutamos pelo fim da erotização na mídia que não podemos lutar pela pornografia ética. Temos demandas diferentes para grupos e momentos diversos. Não somos uma massa com som monocórdio. Há entre nós pautas dos mais variados tipos e, tomadas as devidas proporções e hierarquias por urgência, é preciso que se ouça todos os lados.

Porque sim, a gente quer salvar o mundo de macacão e usar o tomara que caia com shortinho no bloco. A gente quer se livrar de alguns ritos caros e chatos de embelezamento e usar batom vermelho no trabalho. A gente quer blog de sexo, beleza e também de política e direitos humanos. A gente quer diversidade dentro de nossa unidade e que, um dia, o paradoxo dê lugar à complexidade da Maravilha.

Porque existem roupa pra salvar o mundo e roupa pra rebolar até o chão e não há mal nenhum em querer todas elas. Cada uma a seu tempo, no seu lugar.

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

Blog da Lia Bock