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Lia Bock

Sua rua ainda não tem um grupo no Whats? Prepare-se

Lia Bock

15/12/2017 08h00

(Getty Images)

Depois do Whatsapp da família, depois do Whatsapp dos pais da classe, depois do Whatsapp com o cliente, eis que surge o Whatsapp da rua.
Não que seja ruim exercer a coletividade com os vizinhos – aliás essa é uma proposta bem interessante num mundo em que muita gente não cumprimenta quem mora ao lado – mas será que o melhor mesmo é fazer isso por mensagem?

Não é novidade que nas relações virtuais as pessoas se encorajam, crescem, apontam o dedo e destilam fake News sem medo. Neste contexto o grupo da rua vira uma espécie de assembleia 24h, um púlpito em que as pessoas tentam desesperadamente convencer as demais de seus pontos de vista. Poucos ali estão a fim de escutar. A maioria quer falar, desovar a raiva ou exibir as glórias.

O papo mais curioso (e frequente) nesses grupos é o da segurança. Aquela que depende de todo um contexto social, mas ali, nas letrinhas, fica parecendo um simples: nós contra eles. "Os bandidos" são o monstro, essa entidade sem alma. Qualquer um (que se encaixe no padrão racista) é suspeito. E o guardinha vai de vítima a culpado em dois cliques.

 Sonho

No mundo ideal o Whatsapp seria uma ferramenta linda para a aproximação das pessoas. No bairro poderia servir como catapulta para a volta de uma convivência mais humana e próxima, dessas de comadre e compadre que perdemos com o surgimento das tecnologias todas e o mundo on demand ao nosso dispor.

Hoje, nossa casa tem janela para o mundo e o bairro virou uma coisa distante. Muitos vizinhos se odeiam e passam seus dias pensando em chamar a polícia para reclamar de quem mora ao lado. Claro que não é todo mundo que é assim e existem vizinhos muito bacanas por aí, daqueles que compartilham o cuidado da casa, a proza no portão e um grupo gentil no Whats, mas essas histórias estão cada vez mais raras e o que vemos (inclusive no Facebook, nossa rua online) são vizinhos indignados com o comportamento alheio. Com o barulho, com o cheiro, com o carro ocupando duas vagas, com o sexo em volume elevado, com a bola, com as crianças barulhentas. Até porque… vizinho incomoda mesmo.

Mas aí o que a gente faz? Monta um grupo com todo mundo dentro?

Será que é uma boa estratégia?

Talvez falte maturidade nas pessoas para lidar com essa tecnologia. Talvez só falte noção mesmo. E mais que isso: daqui a pouco a gente não vai mais conseguir sair do Whats. Teremos tantas demandas entrando por ali que não vai tempo de mais nada, muito menos de olhar para a cara do vizinho e dar bom dia.

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

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