Topo

Lia Bock

Namoro é estado de espírito, não status de relacionamento

Lia Bock

11/06/2017 04h00

O dia dos namorados serve pra bem pouca coisa. Uma delas é escrever uma carta de amor pra quem de fato pega na minha mão e não solta, recebe o meu amor e não surta, pra quem me celebra e não julga. E pra você que acha que esse tipo de parceria a gente só encontra no casamento dos meus pais e em alguns casais que passam a barreira dos 25 anos (felizes) juntos, um alento: estamos cercados desses amores!

Estamos preenchidos por esse sentimento sólido que tanto almejamos. Só que muitas vezes olhamos para o lugar errado. É como se tentando achar a lua que nasce, déssemos as costas para o mais lindo pôr-do-sol. Hoje eu tô de frente pra ele. Me alimentando de um amor que já dura 20 anos, sem nunca parar de sorrir e gargalhar. Igual aos meus pais.

Esse texto é pra você, Carol, minha amiga. Minha vida.

No nosso primeiro encontro, eu engasguei. Quase morri com uma saliva que desceu errado. Estava nervosa, fomos ao cinema. Assistir Hitchcock em Londres era um programão. Pena que eu ainda não falava inglês. Você estava de casaco longo e salto e trazia a Bia, a amiga de passo firme. Tive que sair da sessão e me recompor. Lembra? E vocês contaram depois, meio a gargalhadas, que a ideia era se livrar de mim bem rápido depois do filme.

Você esperava encontrar aquela pirralha, prima do seu ex, e eu esperava a tal da moça séria que comia flor. Eu vi você no programa do Jô. Não havia nenhum indício de que um amor nasceria dali. Mas eu não conhecia ninguém na cidade e prometi pra minha mãe que procuraria você. Eu tinha 20 anos recém feitos e um Fibrax na bolsa. Você amava Fibrax. Te dei, era o último. Quem ama Fribrax?? Eu. E você.

E daí você me ligou no dia seguinte e eu te liguei no outro e no outro e assim, fomos aproximando nossos corpos, nossos copos, nosso mundos. Naquela época, você fotografava o embaixador e eu "ainda nas aulinhas de inglês". Mas você viu algo em mim e eu vi o mundo em você. Moramos juntas, cozinhamos juntas, viajamos, juntamos nosso amigos, tivemos quatro filhos e uma diversidade incrível de maridos. Te pedi em casamento algumas vezes. Numa delas com joia de plástico em caixinha de veludo. Lembra? Eu casaria com você mil vezes e nunca me esqueço do dia que que você me disse: "Li, eu te amo, mas não enfia sua língua na minha boca, por favor!?".

Você me areja, me rega, me coloca numa banheira cheia de velas e essências e transforma minha tristeza em arte. Seu olhar sobre mim me eleva. Lembra quando quebramos juntas uns copos para ver se quebrava alguma coisa que doía no peito? Amo seu jeito de espantar a melancolia porque você a respeita. Você me ensinou que não somos nada sem ela. Você também me ensinou a tomar whisky e trocar a fralda de um bebê. Me ensinou que comer é um prazer e que a cozinha é a parte mais romântica da casa. Juntas aprendemos que dá pra discordar sem perder a ternura jamais.

Nosso amor é lindo porque não dói. E hoje eu tô mais para "elas foram felizes para sempre" do que para "seja infinito enquanto dure". Hoje eu quero esse amor eterno que nos borbulha. Quero o amor que encaixa cômodo sem deixar de ser instigante. Hoje, eu quero você e a sua doçura ácida absolutamente divina. Quero uma bandeja do mais fino salame que encontrar no mercado e a cerveja Hoegaarden, porque é assim que você gosta.

Quero segurar na sua mão e dizer: posso te dar todos os anos da minha vida de perto? Posso te dar aquela lambida no canto da boca que você aprendeu, com os anos, a gostar? Porque não tem marido ou namorado pra quem eu tenha dado meu coração como eu dei pra você. Casa comigo? De novo.

Sobre a autora

Comentarista na CNN Brasil, a jornalista Lia Bock começou a blogar em 2008 no site da revista "TPM", onde foi também editora-chefe. Passou por publicações como "Isto É", "Veja SP" e "TRIP". É autora dos livros "Manual do Mimimi: do casinho ao casamento (ou vice-versa)” e do "Meu primeiro livro", ambos editados pela Companhia das Letras. É mãe de quatro filhos e pode ser encontrada no Instagram @liabock e no Twitter @euliabock

Sobre o blog

Um espaço para pensatas e divagações sobre notícias, sexo, filhos, coração partido, afetações apaixonadas e o que mais parecer importante ao universo feminino.

Blog da Lia Bock